Quando os pais são mais infantis do que os filhos

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Vivemos tempos estranhos, em que alguns pais revelam menos maturidade e menor adaptação social do que os seus filhos, como se, no fundo, quisessem trocar de lugar com eles. São os equívocos da parentalidade.

Todos conhecemos o mau comportamento de alguns pais de crianças praticantes de futebol infantil, que por vezes chega ao ponto de haver treinadores que exigem a sua ausência das bancadas. Eles xingam os árbitros, os próprios filhos e vão pedir contas aos treinadores quando não os inserem na equipa titular de cada jogo. Um mau exemplo. Uma vergonha. Ainda agora uma festa de Natal de uma escola básica italiana em Gela, na Sicília, acabou com as crianças aterradas e a chorar devido a uma luta entre duas mães. O jornal Corriere della Sera conta que tudo começou quando duas mulheres se desentenderam por causa do melhor lugar para filmarem os petizes na peça de teatro no palco. Seguiu-se um arraial de socos, pontapés e bofetadas, envolvendo os familiares, o que terá provocado a fuga de outros pais com os filhos de asas de anjo nas costas, a chorarem.

Mas podíamos falar também da verdadeira aberração dos concursos de beleza infantil, nos Estados Unidos, onde as meninas são penteadas, maquilhadas, vestidas e adornadas de forma profissional, como se de mulheres adultas se tratasse, numa erotização doentia que deve ser a delícia dos pedófilos voyeurs.

Trabalhei em clínica psicológica durante muitos anos, como psicoterapeuta. Uma das conclusões a que mais depressa cheguei foi que no caso de muitos dos pais que levam os filhos ao psicólogo devido aos seus comportamentos incomuns, na realidade deveriam ser mesmo eles – os pais – a fazer terapia. O problema não se encontra nos filhos, a não ser como reacção a alguma disfunção parental.

O caso do futebol é paradigmático da cultura de competição doentia a que alguns pais sucumbem. Por outro lado há sempre a ambição financeira transformada em esperança de que o rebento venha ser um novo CR7 e lhes encha os bolsos de milhões. Ou, ainda, a velha questão da projecção pessoal dos pais nos filhos, a quem exigem que cumpram o sonho que a vida não lhes permitiu realizar, ou para o qual lhes faltou o engenho e a arte. Esta transferência torna-se uma pressão injusta e inadequada sobre crianças que apenas desejam desfrutar da sua infância, como seria normal e salutar.

E que dizer das crianças-soldado em África, ou das crianças-bomba do jihadismo, ou das crianças usadas a mendigar por conta de terceiros, ou das meninas iniciadas no comércio da carne branca?

Sabemos que não há escolas de pais. A parentalidade aprende-se com a prática e a observação. Também sabemos que há demasiadas crianças que vieram a este mundo apenas porque sim, sem nunca terem integrado qualquer propósito de vida dos progenitores, sendo consideradas e tratadas por eles como autênticos empecilhos. Sabemos, ainda, das dificuldades em criar filhos em países que não investem em políticas de natalidade.

A perspectiva hebraica sobre os filhos era um assunto sério. Desde logo porque eram valorizados. Embora a criança como figura jurídica não tivesse relevância na sociedade do Antigo Israel (como de resto nas culturas da época), a verdade é que a descendência era sempre bem-vinda, as mulheres estéreis eram consideradas amaldiçoadas por Deus e os filhos vistos como uma bênção do Senhor: “Eis que os filhos são herança do Senhor, e o fruto do ventre o seu galardão” (Salmo 127:3). Ao contrário dos romanos, os judeus não praticavam o infanticídio. Também não praticavam rituais de sacrifícios humanos à divindade, ao contrário do deus amonita Moloque, em honra de quem se sacrificavam crianças no fogo.

Mas a educação das crianças era igualmente considerada fundamental. Salomão dizia: “Educa a criança no caminho em que deve andar; e até quando envelhecer não se desviará dele” (Provérbios 22:6).

O cristianismo foi beber o respeito pela vida dos filhos ao judaísmo e aprofundou-o. O Deus encarnado não surge na História já em fase adulta ou chegado num disco voador, mas nascendo como bebé, no ventre duma mulher do povo, a quem pastores e cientistas (astrónomos do Oriente, os chamados “reis magos”) prestaram tributo, elevando assim a dignidade intrínseca da criança, enquanto sujeito social. A igreja primitiva também prestava atenção às crianças. Lucas fixa a importância da descendência na parábola do Filho Pródigo. Paulo ensina os pais a não provocar os filhos à ira (Efésios 6:4) e os filhos, por sua vez, a obedecerem e honrarem pai e mãe (6:1-2). O centurião convertido em Filipos foi baptizado, ele e a sua casa, isto é, toda a família, o que incluía a prole e os escravos (Actos 16:33).

Na herança cultural judaico-cristã os filhos não são considerados objectos ou empecilhos, mas pessoas revestidas de dignidade e relevância, sendo a sua educação levada muito a sério. Convenhamos. Todos os seres humanos chegados a este mundo precisam e merecem ter pais que sejam de facto adultos e não garotos imaturos.

José Brissos-Lino

 

Fonte: VISÃO online, 02/01/19

Valores

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Vivemos num mundo extremamente confuso que parece cada vez mais um sítio mal frequentado, em todas as esferas da actividade humana.

No futebol, por exemplo, os adeptos mais ferrenhos não se incomodam se os dirigentes do seu clube são mafiosos, vigaristas, boçais ou gostam de fazer figuras de palhaço. Desde que a equipa ganhe, o resto não interessa. Os treinadores também podem ser malcriados, ordinários e violentos para com os adversários ou parecerem atrasados mentais a falar. Nada disso interessa desde que a equipa ganhe títulos.

Na política vale tudo. A corrupção e todos os crimes de carácter económico estão cada vez mais presentes, em consonância com alguns grandes empresários, cujo principal objectivo parece ser tentar por todos os meios mamar nas tetas do Estado como se não houvesse amanhã. Bem dizia Marx que “a desvalorização do mundo humano aumenta em proporção directa com a valorização do mundo das coisas.”

O sector financeiro é o que se vê. Os banqueiros são capazes de sacar o que puderem a qualquer pequeno cliente, lançando mão de todas as artimanhas possíveis, mas com a outra mão dar milhões aos amigos. São capazes de sugar recursos públicos ao país – suportados por todos os contribuintes – para distribuir dividendos fartos aos seus accionistas.

As grandes empresas contratam especialistas em matéria de fuga ao fisco, e utilizam off-shores e paraísos fiscais de modo a subtrair ao país os recursos necessários ao seu desenvolvimento, em nome de lucros cada vez mais vultuosos.

Os especuladores dos mercados financeiros apenam visam o lucro, sem que o mesmo corresponda a qualquer tipo de criação de riqueza, desenvolvimento ou sustentabilidade social. Há uns anos chegaram mesmo ao ponto de especular com os cereais, tendo provocado cenários graves de fome e subnutrição em diversos países sub-desenvolvidos e sem qualquer sustentação moral nem problemas de consciência. Foi Antoine de Saint-Exupéry que escreveu: “Apesar da vida humana não ter preço, agimos sempre como se certas coisas superassem o valor da vida humana.”

O comportamento de parte do sistema judicial, da advocacia à magistratura, passando pelo Ministério Público também deixa muito a desejar em matéria de boas práticas e seriedade.

O que está a dar, na vida pública, é ser populista, manipulador e demagogo, desde que se saiba explorar os medos profundos e ressentimentos dos concidadãos.

Até o sector religioso se deixou capturar pelo veneno dos tempos, com escândalos sucessivos. Buda pensava que os seres humanos demasiado apegados às coisas materiais eram obrigados a reencarnar incessantemente, até compreenderem que ser é mais importante do que ter. Não acredito nessa estrada, mas concordo com o destino. Há uma séria crise do Ser no homem contemporâneo.

 

Fonte: José Brissos-Lino, O Setubalense, 11/05/18.

 

 

 

 

 

 

“Tem sido a «luta» das  mulheres  a  contribuir para a  mudança  também  das vivências religiosas” 

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A Amadora recebeu esta 4ª feira7 de marçona Biblioteca Fernando Piteira Santos, conferência “Religiões e IdentidadesContributo ou obstáculo para a Igualdade de Género?”  

“A Igualdade de Género não é a dissolução das características do género”, defendeu o pastor protestante José Brissos-Lino, diretor do mestrado em Ciência das Religiões da Universidade Lusófona. Brissos-Lino reconhece que o “cristianismo sempre teve dificuldade em lidar com a sexualidade e, portanto, com a mulher”, mas que “a teologia cristã não permite a discriminação de género”. Em S. Paulo “não há macho nem fêmea” para Deus e nos primeiros tempos havia mulheres a liderar comunidades cristãs. 

Igualdade de Género é um dado “nos evangelhos e na vida de Jesus”, acrescentou o padre jesuíta José Maria Brito. Sobre o acesso da mulher ao sacerdócio na Igreja católicaconsiderou que “o debate tem sido feito mais pela dimensão do poder“, quando o sacerdócio é, “a exemplo de Jesus”, um serviço de responsabilidade transversal.  

O padre jesuíta e diretor do site Ponto SJ acredita que pode não estar longe a existência de diaconisas na Igreja, mas o eventual acesso da mulher ao sacerdócio, “a acontecernão será na nossa geração“. 

A perspetiva dos textos islâmicos sobre a mulher foi apresentada por Filomena Barros. A professora de história do Islão e da Linha de Investigação em Género e Religião da Lusófona, lembra que os textos sagrados “devem ser colocados no contexto de quem os escreveu” e há que diferenciar as leituras sagradas, “necessariamente sujeitas à exegese”, das construções social, cultural e politicamente desenvolvidas a partir delas. 

O que se verifica é muito diferente deste exercício exegético, embora “a realidade islâmica seja muito diferenciada”. Há países de maioria islâmica que têm ou tiveram mulheres como chefes de estado. No contexto do tempo, e em relação ao judaísmo, exemplifica a historiadora, o “Alcorão é um passo em frente na dignificaçao da mulher, tem uma Sura dedicada às mulheres, outra a Maria, e usa nalgumas partes o masculino e o feminino – «os» muçulmanos e «as» muçulmanas”. 

As mulheres tinham um papel relevante no início do Islão, mas mantiveram um obstáculo: “o conceito de pureza e impureza“, agregado ao sangue. A mulher carrega ainda este estigma e a religião mantém os rituais de purificação como elemento diferenciador e/ou segregador. 

Num testemunho pessoal, Saroj Parshotam admitiu que a mulher ainda transporta estigmas também entre hindus e recordou que, quando nasceu, houve gente na família que lamentou ser uma mulher. Esta situação é mais cultural e de organização social que religiosa, apesar de alguns textos que constituem as narrativas sagradas do sanatma dharma aparentem substimar a mulher. “No tempo dos Vedas havia igualdade entre homens e mulheres”, diz Saroj. Embora possa cultural e socialmente não parecer, “os hindus respeitam muito o papel da mulher na comunidade”, destacando-se sobretudo “o papel da mãe, a sabedoria da mãe que domina a família hindu e é respeitada acima de todos”. Há na tradição mitológica e filosófica hindu uma dimensão feminina sem a qual não se compreende a própria vida. É a shakti, a “força” ou “energia” que dá operacionalidade à existência e ganhou forma de divindade feminina. 

O debate sobre Igualdade de Género “não foi trazido à praça pública pelas religiões, mas como oposição ao pensamento religioso”, acrescentou Filomena Barros. José Brissos-Lino admitiu que o “cristianismo tem sido um obstáculo, mas a fé cristã é um contributo para a Igualdade de Género”.

O padre José Maria Brito defendeu a perspetiva católica, segundo a qual o debate é difícil quando o conceito de Igualdade deriva para a Ideologia da indiferenciação sexual, porque homem e mulher, “na perspetiva bíblica, são criaturas de Deus” em complementaridade. “O que sou não é tudo inventado por mim”, concluiu. 

 depois do debate, o moderador Joaquim Franco, investigador em Ciência das Religiões e coordenador do Observatório para a Liberdade Religiosaverificou que, “em contexto religiosonomeadamente o católicoconfunde-se por vezes Igualdade de Género com Ideologia de Género e, rejeitando esta, que é ainda um campo indefinido e culturalmente complexo quem persista em velhos argumentos para dificultar o caminho da igualdade, que passa pelo direito à igualdade nos acessos“. 

Embora sejam um desafio às religiões, “que devem repensar e reconsiderar o papel da mulher para garantir a dignidade em igualdade“, defendeu Joaquim Franco, “os grandes problemas no campo da Igualdade de Género não se localizam hoje nas religiões, que podem até ser aliadas neste processo“, sublinhou a historiadora Filomena Barros, lembrando, a propósito, que “a crescente violência doméstica não é um problema religioso” e pode até ser combatida com a ajuda das religiões. 

Num comentário final ao debate, a Conselheira para a Igualdade na Amadora defendeu que a raiz do problema não está nas religiões, mas na forma como homens e mulheres se organizam e relacionam para o exercício do poder“. Lurdes Ferreira recordou ainda assim que “tem sido a «luta» das mulheres a contribuir para a mudança também nas vivências religiosas“. 

Este foi o segundo de um ciclo de debates a realizar mensalmente na Amadora, no âmbito d’O Mundo na Amadora – Religiões e Culturas em Debate, um projeto de parceria entre a Câmara Municipal da Amadora e a Área de Ciência das Religiões da Universidade Lusófona. 

próximo debate realiza-se a 4 de abril, sob o tema Religião e Políticauma relação (im)possível?, com a participação de políticos(as) e religiosos(as). 

JF

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Medo de quê?

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Uma obra que, não sendo exaustiva, desmonta o machismo dominante nos meios eclesiásticos.  Escrito por um consultor pontifício para o diálogo ecuménico, fundador e prior duma comunidade monástica (e não por uma mulher!) põe a nu o pecado milenar da igreja cristã contra as mulheres (ed. Guerra e Paz, 2017).

O Natal de Manuel Bandeira

 

Muitos escritores se inspiraram no tema do Natal para escrever contos de profunda reflexão sobre a vida e a humanidade, como é o caso de Dostoiévski, Charkes Dickens e Tolstoi. Nessas histórias, a intensidade da tristeza e o senso de abandono são por vezes quase insuportáveis – crianças e mulheres enfrentando a neve, a escuridão e a morte, velhos campesinos solitários em sua pureza de fé e solidariedade contrastando com a dureza de corações indiferentes.

A literatura brasileira também tem suas amostras da força do Natal como temática e como marco da nossa latinidade católica. É o caso de Coelho Neto, Machado de Assis, Murilo Mendes, Jorge de Lima, Viriato Corrêa, Raul Pompeia e Mario de Andrade. Neste pequeno espaço, quero me dedicar aos poemas de Natal de Manuel Bandeira.

Ao todo, Bandeira escreveu dez poemas de Natal, seis de sua autoria e quatro em tradução de autores europeus. Ele mesmo faz uma revisão de suas obras natalinas e da importância que ocupam em sua carreira literária. Eles nasceram em circunstâncias bem demarcadas ao longo de sua vida, a juventude na Suíça, o Rio de Janeiro de 1939, a II Guerra Mundial, alguns por encomenda do jornal O Globo ou de Villa-Lobos.

Surpreende, nos poemas natalinos de Bandeira, a abundância de passagens bíblicas transcritas, adaptadas, aludidas. Diferente de outros autores que usam o Natal apenas como referência temporal, uma data no calendário, para escrever sobre algum incidente cotidiano, Bandeira mergulha nos detalhes e nos diálogos que as Escrituras oferecem. É o caso do poema “Anunciação”, em que se lê: “Maria, não temas: / Deus escolheu-te, a mais pura / Entre todas as mulheres, / Para um filho conceberes / No teu ventre e, dado à luz, / O chamarás de Jesus, / O santo Deus fá-lo-á grande, / Dar-lhe-á o trono de Davi, / Seu reino não terá fim”.

O poema “Canto de Natal”, que veio a ser musicado por Villa-Lobos, traz a cena do alegre nascimento do “Jesus menino”. O poema faz lembrar, em parte, as singelas canções de Natal de Martinho Lutero. Bandeira escreve: “Nasceu sobre as palhas / O nosso menino”. Lutero teria escrito: “Num berço de palha dormia Jesus, / O meio menino que ali veio à luz”.

O poema mais profundo e quem sabe o mais complexo leva o título de “Presepe” e descreve o mistério da encarnação de Jesus. No poema, Bandeira liga o nascimento de Jesus ao seu sofrimento na cruz, “O fel e o vinagre, / Escárnios, açoites, / O lenho nos ombros, / A lança na ilharga, / A morte na cruz”. Um pouco adiante, o poeta diz: “Mais do que isso / O amedrontaria / A dor de ser homem”.

Em sua perplexidade e olhando para o ser humano, “[e]sse bicho estranho / que tortura os que ama”, “essa absurda imagem de Deus”, o poeta conclui que o nascimento de Cristo foi um grande milagre, mas “um milagre inútil”. Sim, o poeta termina em tom desesperado de uma esperança triste. Ele mesmo reconhece que se trata de um poema amargo com um forte teor político relacionado aos crimes de Stalin. Apesar do tom desencantado, a reflexão é válida e atual. O Natal nos faz pensar no destino da humanidade.

Fonte: Blog de Gladir Cabral.

Os poemas de Manuel Bandeira podem ser encontrados na coletânea O Natal em Manuel Bandeira e Cândido Portinari.

PSD: quem quer casar com a carochinha?

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O PSD anda à procura de um novo líder desde ontem, depois do descalabro eleitoral autárquico.

A fazer fé na imprensa, há pelo menos umas quatro ou cinco linhas ideológicas em confronto.

Rui Rio, já se sabe, que aposta em trazer o partido mais para o centro político e tem boa relação com António Costa, como é sabido. Parece ser um homem sério, que aposta no rigor e não vende as suas convicções para ser popular. Deu provas na câmara do Porto, embora sempre com uma relação tensa com alguns sectores da sociedade portuense, em particular nas áreas culturais e desportivas.

Depois temos Luís Montenegro, indefectível de Passos Coelho, uma espécie de Passos número dois, tal como ele defensor das políticas neoliberais, que não representa mais do que a estratégia do empobrecimento e do corte dos direitos sociais, salários e pensões, que o país tão bem conheceu.

Na fila vem ainda Paulo Rangel que, apesar da vantagem de ter uma profissão – ao contrário de PPC – e não depender da política, se tem comportado como um demagogo da pior espécie. Vejam-se as suas intervenções na universidade de Verão da JSD nos últimos anos ou no programa televisivo onde faz comentário político. A sua praia é o populismo (funciona bem em campanha eleitoral) e a demagogia. Talvez seja mesmo o mais perigoso de todos.

Mas se o PSD optar por um populista que acrescente ainda uma vertente xenófoba, então tem à mão o “disponível” André Ventura. Uma desgraça chegada à política pela via dos programas televisivos manhosos de comentário desportivo.

Ao longe acena Santana Lopes, que tem a vantagem de talvez conseguir unir várias tendências e de fazer boas campanhas eleitorais, mas a desvantagem de saber a passado e de em tempos ter saído do governo pela porta baixa.

Mas ainda há tempo para Marques Mendes e quem sabe, mais alguém surgir no horizonte, montado num cavalo branco. Ou que precise de fazer a rodagem da sua viatura…

O estado do futebol

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O FCP esteve impecável. O SCP perdeu mas com dignidade. O SLB deu barraca. Mas foi bom, que é para os dirigentes do clube tetracampeão perceberem que os sucessos empresariais levados ao extremo podem hipotecar os sucessos desportivos.

E sem sucessos desportivos também não há sucessos empresariais.

Está visto que esta época começou estribada num equívoco. Não se pode desfazer uma defesa sem alternativas válidas. Mas atenção, a equipa ainda está a tempo de dar a volta.
Esta época quem está mais consistente, regular e a dar cartas é o FCP. Dá gosto ver a equipa jogar. Ao contrário dos jogos fora do campo, que só enojam qualquer pessoa bem formada e em perfeito juízo.

Não sou adepto de nenhum dos grandes (mas tenho simpatia pelo Benfica, o maior clube português e com mais troféus no futebol), e também não sofro de clubite. Sou vitoriano. De Setúbal.

Gosto do jogo nas quatro linhas, do futebol, mas tenho nojo do ambiente que rodeia esse grande desporto de massas.

Tenho nojo do comportamento de boa parte dos dirigentes e seus lacaios, assim como de boa parte da imprensa desportiva, que mais não faz do que atirar gasolina para o fogo.

Será que não poderíamos apenas apreciar o desporto em si e substituir aqueles programas de televisão vergonhosos a que temos direito, nos canais do cabo, por outros com especialistas no jogo, que nos ajudem a entender e apreciar este desporto de equipa?

Não poderíamos também deixar-nos de frustrações, complexos mal resolvidos e de puxar pelos nossos instintos mais primários, como se estivéssemos envolvidos em lutas tribais, como diz o Desmond Morris? Afinal somos campeões europeus.

Boas como uma dor de dentes

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Os comentadores de direita não têm espaço mental para elogiar as vitórias da política económica e financeira do governo. Por exemplo, a propósito da súbita subida do rating da república e consequente retirada do “lixo”, preferem diluir os méritos, ou dizer que vem tarde e que se a direita estivesse no poder já teria vindo. Isto, apesar de todos os elogios que vêm da Europa.

Como se não bastasse a hipocrisia, encontraram agora um novo mote que é dizer: “Então falavam mal das agências de rating, chamavam-lhes abutres, e agora já são boas?” Confesso que não entendo qual é a questão.

Meus amigos, as agências de rating continuam a ser o que sempre foram: más para todos os países com economias mais frágeis. E não só. Ou já se esqueceram das notações seguríssimas que deram a bancos americanos pouco antes de falirem e precipitarem a crise com que todos levámos pela proa? A única coisa que fazem é apertar o garrote aos países em dificuldades.

A bem dizer isto é tal e qual como a dor de dentes. É péssima, mas quando se vai embora é um alívio. E então? Quando passa a dor devíamos fazer o quê? Chorar?…

Tenham maneiras.

 

Não é hora de ficar calado

Isto é o que membros da Administração Trump e alguns líderes cristãos americanos estão a defender. Seis ou sete neonazis a espancar e tentar matar um jovem negro, que consegue fugir, ensanguentado. “Morre, negro!”, é o que se ouve (ver vídeo).

Violência gera violência.

Os Estados Unidos tiveram uma única guerra civil (1861-1865) por causa do racismo, mais tarde a luta pelos direitos civis, nos anos sessenta, que foi regada com o sangue de mártires como o Pr. Luther King, conseguiram eleger um presidente afro-americano, pela primeira vez (2009-2017), e agora parece que alguém está apostado em fazer a História voltar para trás, em especial desde que Trump levou para a Casa Branca o supremacista branco Steve Bannon.

Compete à Igreja elevar uma voz profética, à semelhança dos profetas do Antigo Testamento e em obediência ao Evangelho. Tudo quanto for menos do que isso é vergonhoso e lamentável.

 

Franklin Graham prestou um mau serviço à América

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Lamento, mas não posso continuar calado.

Quando os nacionalistas brancos marcharam nas ruas de Charlottesville a destilar ódio, agredir e matar, Graham resolveu culpar o governador e quem decidiu a remoção de um monumento racista da cidade, com o argumento de que “deveriam ter sabido” que a decisão não seria popular entre a extrema-direita.

O filho de Billy Graham aponta o dedo constantemente aos autores de ataques terroristas quando são muçulmanos, acusando todo um sistema de crença islâmico e afirmando que “estamos em guerra com o Islão”. Mas desta vez tentou a habilidade de condenar toda a gente menos os arruaceiros e assassinos supremacistas brancos, ou a ideologia nacionalista anti-cristã que professam.

E acrescentou que fazer a ligação natural entre a ideologia de Trump e a dos terroristas de Charlottesville (não lhes chamou assim, como é evidente!) é simplesmente uma tentativa de “Satanás dividir os cristãos”, numa altura em que Trump está a perder grande parte do apoio das igrejas.

Mas todos sabemos que os supremacistas brancos integram a base de apoio político do presidente. Daí ele ter resistido a condená-los, durante dois longos dias, só o fazendo depois de ter sido alvo de duras críticas de toda a classe política, incluindo do seu partido e de ter visto vários colaboradores seus demitirem-se em protesto, na Casa Branca.

A ideologia essencial destes grupos (Ku Klux Klan, alt-right, neonazis, movimento nacional socialista ou Partido Americano da Liberdade) é a de que a raça branca é superior a todas as outras e, por isso, deve dominar a sociedade. O KKK, por exemplo, nasceu em meados do século XIX num Sul que não aceitava a derrota na Guerra Civil americana e o fim da escravatura.

Ora, tal filosofia é profundamente anti-cristã e anti-bíblica, como é bom de ver, e chegou a dividir a poderosa Convenção Baptista do Sul há uns meses.

Os criminosos de Charlottesville vieram descrever publicamente Heather Heyer, a mulher brutalmente assassinada por um jovem nazi, admirador de Hitler, como “uma vadia gorda de 32 anos e sem filhos”. Segundo o DN, a declaração em questão dizia que “muitos estão felizes por Heather ter morrido porque ela era ‘a definição da inutilidade’ e um fardo para a sociedade por não ter filhos – mulheres sem filhos são buracos negros que sugam dinheiro e energia”.

É tristemente curioso ver como Franklin Graham, enquanto líder espiritual americano de relevo, não é capaz de ter uma única palavra de condenação para este tipo de comportamentos, preferindo apoiar cegamente um presidente sem valores nem ética, e cobrindo assim de vergonha todo o povo cristão americano.

E a mim também.

 

O meu amigo Luís Gonzaga lembrou oportunamente que em 1943, o departamento de guerra dos Estados Unidos lançou este vídeo para dizer aos americanos que rejeitassem a retórica fascista. 74 anos depois, este vídeo é profundamente actual. Lembremo-nos todos de que, como escreveu Edmund Burke: “tudo o que é necessário para o triunfo do mal é que os homens bons não façam nada”.

 

Alt-PSD

Pedro Passos Coelho, inaugura edifícios centrais do Parque Tecnológico de Óbidos

“We are what we pretend to be, so we must be careful about what we pretend to be.”

Kurt Vonnegut

No seu discurso no Pontal, Passos Coelho disse que não queria “qualquer um” a viver em Portugal. Nestes tempos mediáticos, por uma questão de precaução e de sanidade mental, sempre que ouço uma afirmação polémica como esta, desconfio. Infelizmente, a declaração de líder do PSD consegue ser ainda pior em contexto.

Em primeiro lugar, o seu timing. Este discurso foi proferido num fim de semana marcado por uma sangrenta manifestação nazi nos Estados Unidos. Antes destes acontecimentos, o PSD havia reiterado o seu apoio a um candidato autárquico que proferiu declarações racistas, recebendo o apoio do PNR e o repúdio do CDS.

Em segundo lugar, a afirmação completa consegue ainda ser pior. Passos não diz apenas que não quer qualquer um a viver em Portugal, mas que caso isso aconteça o país deixará de ser seguro. Segundo Passos, os estrangeiros, qualquer um deles, são assim uma fonte de insegurança e violência, ao contrário dos portugueses, que são todos cumpridores da lei.

Em terceiro lugar, revela um complexo de classe. O primeiro governo liderado por Passos criou o “visto gold”, que permitia a entrada no país a qualquer um que tivesse determinado dinheiro para gastar. Presumo que na visão de Passos criminalidade seja incompatível com riqueza.

Por outro lado, este discurso xenófobo e nacionalista parece incompatível com os seus discursos anteriores, segundo os quais os portugueses eram uns piegas que viviam acima das suas possibilidades, ao contrário dos exemplares povos do norte da Europa.

Passos Coelho nunca teve uma consistência de pensamento ou de ideologia, foi sempre modificando segundo as tendências mais recentes. Ele é uma espécie de Spinal Tap da política, mas pelo menos devia seguir o conselho de Vonnegut e ser mais cuidadoso com o que finge ser.

 

Fonte: CRG, 365 Forte.

Jornalismo da treta

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Não entendo mesmo esta pressa parola dos “jornaleiros” de agora darem as notícias de qualquer maneira, sem confirmação, na ânsia de serem os primeiros. Ontem ouvi (e vi no sticker, em rodapé) um canal de televisão afirmar que a avioneta tinha morto uma mulher na casa dos trinta anos e a sua filha de dez na praia.

Mais tarde corrigiram o erro, tanto quando ao sexo e idade do adulto como à idade da criança falecida, e ao facto de ambos não terem qualquer relação de parentesco. Mas o que é que esta gente tem na cabeça?

E como ficaram as pessoas que tinham familiares naquela praia com essas idades e relação de parentesco?

É isto o tal jornalismo responsável? Mas o pessoal parece que gosta…

Jornalista profissional

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Se eu fosse jornalista profissional gostaria de ser informado de forma profissional e objectiva, para poder fazer a devida mediação aos meus leitores/ouvintes, como me competiria.

Se eu fosse jornalista profissional não gostaria de andar aos empurrões com os colegas, à molhada, numa espécie de concurso para fazer perguntinhas soltas a um responsável, no meio da confusão duma catástrofe.

Se eu fosse jornalista profissional não gostaria de me comportar como artista de circo que está a dar espectáculo, mas quereria apagar-me, porque eu em caso algum seria a notícia.

Se eu fosse jornalista profissional tentaria, em todo o caso, separar a informação do entretenimento, do espectáculo e da pornografia emocional.

E se em Tancos…

 

… não tivesse havido, nem assalto, nem roubo nem furto?

(divagações de um cidadão, num domingo invernoso em pleno verão)

 

Texto de Rodrigo Sousa e Castro

Deixemos o pequeno buraco na rede da cerca do quartel e o arrombamento sem violência da porta do paiol como peças para finalizarmos o puzzle que nos “atormenta”.

1 – Todo o material em falta é material perecível, isto é, não existe uma única espingarda, metralhadora, revólver canhão ou lança mísseis no rol das faltas. Nem sequer um cinturão ou qualquer outra peça do fardamento e equipamento.

Por outras palavras, e clarificando, perecível quer dizer que todo este material em falta, era e sempre foi usado em exercícios militares de rotina ou imprevistos e gasto ali mesmo devendo em bom rigor ser abatido à carga, do paiol ou armazém onde foi requisitado logo após cada exercício.

Era esta prática corrente e usual na tropa do meu tempo. Mas também havia graduados , oficiais, que muitas vezes passavam por cima das dotações estipuladas para cada exercício e descartavam os “ resmungos” dos subordinados responsáveis pelo municiamento abusivo extra, com dichotes e palavrões. O resultado era, quem tinha requisitado o material excedido no exercício não o abater e depois, raciocínio comum à época, “logo se veria”.

2 – Para esclarecer cabalmente a natureza “perecível” do material em falta é necessário desmitificar a forma ignorante com que muitos, e até alguns experts, quer em jornais quer nas TV´s, induziram na população, a ideia que o material em falta incluía armamento e mais grave mísseis. 

Desmontemos pois esta cabala para podermos prosseguir.

a ) Da lista oficial de faltas consta uma munição, impropriamente chamada pelos tais experts, de lança míssil ou míssil, mas que se resume a uma granada anti tanque, lançada de um tubo articulado que após o lançamento é descartável e não reutilizável , tal como acontece com o cartucho que contém a pólvora que provoca a saída duma bala.
Tão simples como isto.

Na verdade é uma arma que só pode ser utilizada uma vez , tal como qualquer granada.

Para quem se interessa por estas coisas trata-se de um filhote dos panzerfaust nazis, que até uma criança podia lançar.

Acresce que esta arma, cuja sigla é LAW ( Lhigt anti-armor weapon) foi retirada do serviço em 1983, portanto há TRINTA E QUATRO ANOS e o seu fabrico descontinuado como agora se diz. Com o ridículo alcance de 200 metros e sem sistemas de guiamento autónomos foi naturalmente substituída por misseis de muito maior alcance , guiados por fio ou wireless através de lançadores esses sim, sistemas não descartáveis e de grande valor bélico e financeiro , como o míssil TOW ou o MILAN.

Presumo até que se alguém quisesse negociar no mercado internacional esta arma, não só não teria êxito, como seria alvo de chacota, incluindo dos rapazes do DAESH que estão armados até aos dentes com o armamento mais moderno que há.

Estando em uso no Exército anos e anos a fio fácil é admitir que toda a gente se estaria ca….. como se diz na gíria militar para o seu consumo excessivo e para o acerto das cargas.

b) Todos os outros materiais em falta eram e são obviamente utilizados e consumidos integralmente em exercícios de treino.

3 – Antes de fechar o puzzle uma pergunta que julgo ser a pertinente face ao acontecimento:

– Se havia paióis na zona, vizinhos do “violado”, com certeza com armas sofisticadas, incluindo os tais misseis TOW e MILAN, além de armamento de infantaria pelo menos com valor militar actual, porque foram os hipotéticos assaltantes abrir a porta do paiol com fraco valor.

Não é por acaso que o comentário do secretário geral da NATO a este desaparecimento de material foi a consideração da sua irrelevância.

4 – Acabemos agora o puzzle juntando as ridículas circunstância do pseudo roubo. O buraco na rede e o arrombamento discreto.

Coisa fácil de fazer para quem, acossado pela iminência da entrega do espólio e da prestação de contas das existências tenha sido impelido a optar pela diversão naif.

Boa sorte aos investigadores da PJ e PJM.

Um bom domingo para todos os meus amigos do FB.

 

Fonte: Das Culturas, via Facebook do autor.

Discriminação religiosa disfarçada?

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Segundo o jornal Público “uma família cigana foi impedida de enterrar um familiar no cemitério local e acusa a autarquia de discriminação. O caso aconteceu na Freguesia de Cabeça Gorda, no concelho de Beja, e a advogada da família defende que a decisão não só é inconstitucional, como é ‘um caso de evidente exclusão social”.

A autarquia terá alegado que o enterro foi recusado pelo facto de José António Garcia, que também era pastor da Igreja Evangélica de Filadélfia, de 55 anos, não ser natural ou residente na freguesia.

De acordo com o testemunho dum familiar do falecido, o argumento para a recusa da autarquia foi que o corpo deveria ser enterrado em Pias, onde morreu, ou em Mértola, a sua terra de nascimento. Porém, Prudêncio Canhoto, o mediador cigano da câmara de Beja, afirma que “o falecido estava casado com uma senhora da Cabeça Gorda e que residia há quase dois anos nesta localidade”. Além disso o indivíduo era morador recenseado naquela freguesia.

Como seria de esperar tanto a família do falecido com a comunidade cigana de Beja ficaram revoltadas, tendo interposto uma acção judicial contra o presidente da Junta de Freguesia da Cabeça Gorda e solicitado a intervenção do Alto Comissariado para as Migrações.

O argumento peregrino de Álvaro Nobre, o presidente da Junta, foi que o “falecido passava a maior parte do seu tempo noutras freguesias vizinhas”. Mas tanto a Associação Nacional dos Mediadores Ciganos como outras que repudiaram a atitude prepotente do autarca perguntam se “às pessoas não ciganas de Cabeça Gorda que, por questões laborais, passam a maior parte do seu tempo fora da freguesia” o critério do autarca seria o mesmo.

Este conjunto de associações emitiu um comunicado onde considera que o autarca revelou “um desrespeito moral e físico pelo cidadão falecido e sua família, além de ser claro estarmos perante um acto de discriminação racial”. Consideram ainda ter havido uma notória violação da lei, pelo que anunciaram a intenção de recorrer às instituições democráticas e judiciais com vista à obtenção de justiça e à punição do autarca.

Mas não parece que devam recorrer apenas à ministra de Administração Interna, ao ministro-adjunto Eduardo Cabrita, através da secretaria de Estado para a Cidadania e Igualdade e Alto Comissariado para as Migrações, ao Comité Central do PCP e aos partidos da coligação CDU, como terão feito. Também deviam recorrer à Comissão de Liberdade Religiosa, que funciona no ministério da Justiça, pois, embora não seja citado, tudo leva a crer que haverá aqui igualmente uma questão de discriminação religiosa, uma vez que o falecido era pastor evangélico.

Alguém acredita que se se tratasse dum padre o presidente da Junta negaria o enterro na sua freguesia?

 

Haja alegria

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É certo que no Verão o país gasta o tempo a discutir os disparates da silly season e os fogos florestais (que esquece no resto do ano). Desta vez os incêndios assumiram a importância que se sabe devido às trágicas consequências humanas.

De resto, temos um clube que está em crise profunda (financeira, desportiva e directiva) e resolveu criar a telenovela dos emails, na tentativa de convencer as hostes de que o rival ganhou os últimos quatro campeonatos nacionais devido às artes dum bruxo-polícia guineense. Que excesso de imaginação. Parece o guião duma telenovela mexicana…

Ao pé disto, as gaffes do Salvador Sobral e do Passos Coelho, as candidaturas autárquicas dos dinossauros Narciso Miranda e Isaltino, e o cambalacho do SIRESP pouco contam. E questões como o acordo de Paris sobre o planeta, o Brexit ou a situação da comunidade portuguesa na Venezuela são peanuts.

Haja alegria.

Não se deve brincar com o suicídio

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Não se pode nem se deve brincar com o suicídio, principalmente por causa da vida e da morte.

Albert Camus, disse-o no “Mito de Sísifo”: é um problema filosófico verdadeiramente sério.

Mesmo quando visto pelo lado da crítica social na poesia, como no poema breve de Gregory Corso (“Greenwich Village Suicide”), quando a rapariga com a cabeça cheia de cultura, de Bartok a Van Gogh, sem saber o que fazer da vida(?) se atira da janela.

Ou quando alguém carente de apoio psicológico, escreve também em verso “Morrer/ É uma arte, como outra coisa qualquer./ E eu executo-a excepcionalmente bem” (Sylvia Plath, que acabou por se suicidar aos 30 anos).

Poderíamos ir de Mário de Sá Carneiro até Álvaro de Campos – que não se suicidou – que perguntou “Se te queres matar, porque não te queres matar?”, expedindo o acto potencial para o campo do ousar ou não ousar matar-se.

Agora brincar com o “boato” do suicídio, do suicídio dos outros como arma de arremesso político ( que lugar comum, que “deja vu” do nosso jargão político este), como fez o senhor Passos Coelho, pretenso líder da Oposição ao nível de um qualquer jota, é que é inconcebível. Diz-se que foi um “tiro no pé”, foi mais: foi um tiro no próprio rosto.

Ficou-lhe mal, porque foi hipócrita, pedir desculpa, ainda mais por atirar as culpas para cima da “fonte”, era caso, isso sim, para pedir a demissão. © JTP

Se eu me chamasse Constança

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Se eu me chamasse Constança e a oposição andasse a sugerir a minha demissão de ministra, devido à catástrofe de Pedrógão Grande, se enviasse o grilo falante do PSD (mais conhecido por Marques Mendes) pedir directamente que me fosse embora, eu diria que sim.

Mas primeiro teriam que começar por me provar que, em 26/11/2015, na data de posse do actual governo:

O governo Passos/Portas tinha entregado o SIRESP a funcionar perfeitamente;

O governo Passos/Portas tinha entregado uma floresta ordenada;

O governo Passos/Portas tinha entregado uma floresta com predominância de espécies autóctones e sem sobrecarga de plantação de eucaliptos;

O governo Passos/Portas tinha entregado um interior ocupado e não desertificado;

O governo Passos/Portas tinha entregado um país em que os proprietários florestais privados mantinham a sua floresta sempre limpa;  

O governo Passos/Portas tinha entregado um país em que os proprietários das casas e empresas privadas mantinham as suas propriedades sempre limpas de mato à volta, no perímetro mínimo de 50 metros, de acordo com a lei;

O governo Passos/Portas tinha entregado um país em que todas as estradas mantinham as bermas limpas e sem árvores no espaço previsto na lei.

Se assim fosse, demitia-me. Mas como não é, o que podemos concluir é da responsabilidade de todos os governos nos últimos 40 anos. Sem excepções. A verdade é que, apesar de todas as conquistas sociais – e foram muitas e significativas – o país não foi capaz de travar a desertificação do interior e o desequilíbrio territorial, com todas as consequências que tal facto acarreta.

Pedir a demissão dum governante, nesta situação e nestas condições, é pura demagogia.

Mas para já, Passos Coelho ultrapassou todos os limites ao afirmar ter havido suicídios na sequência da catástrofe, que simplesmente não existiram. Terá sido induzido em erro, mas um ex-primeiro-ministro têm a obrigação de confirmar as fontes antes de produzir afirmações tão graves. Não vale tudo. Estamos à espera de ouvir o seu pedido de desculpas.

Como disse João Quadros “O Passos que diz que pessoas se suicidaram por falta de apoio psicológico, é o mesmo Passos que tirou os apoios as crianças do ensino especial”. E eu acrescento, e foi o mesmo Passos que promoveu a pobreza dos socialmente mais vulneráveis quando governava. Quantos se terão então suicidado?

Uma tautologia

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Esta fotografia é como uma tautologia, começa e acaba em si própria, como os “poemas que são e se significam a si próprios”, no dizer de Harold Bloom.

A sublimação com que se trata esta fotografia há um século, é uma espécie de arkesis. A nossa palavra para o termo grego é ascese. Ascetismo é  o que nos sugere esta fotografia, obviamente.
A mesma intui no nosso espírito uma espécie da já referida arkesis, quando a olhamos atentamente.

Os rostos têm uma relação com a religião, a responsabilidade de serem protagonistas de uma “epifania” preparada, têm a motivação da tristeza de uma religião, nas crianças transparece o começo de uma vida ascética a que as obrigaram.
A fotografia tem uma força própria, a da tragédia. Não mostra nenhuma visão romântica.

Mas exceptua-se um rosto, que denota uma beleza infantil em gestação, uma pose de charme que, por certo, a Jacinta nos seus 7 anos desconheceria. No entanto, faz-se fotografar com a mão inocentemente na cintura. Uma atitude de feminilidade.
Ao fim destes cem anos, penso que  alguém deveria ser responsabilizado por ter cerceado a beleza na adolescência de Jacinta.

© João Tomaz Parreira

O 25 de Abril ainda não chegou à área religiosa em Portugal

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Mais de quarenta anos depois, o 25 de Abril ainda não chegou à área religiosa em Portugal.

Tal como antes, o único representante religioso convidado para as comemorações da revolução de 1974 continua a ser o cardeal patriarca de Lisboa e presidente da Conferência Episcopal. Todas as outras confissões religiosas são olímpica e reiteradamente ignoradas pelo protocolo de Estado.

Onde está a igualdade dos cidadãos perante a lei?

Onde está o respeito pela Constituição, que proíbe a discriminação dos cidadãos em função da sua filiação religiosa, entre outras?

Onde está o estado laico e religiosamente equidistante?

Onde está o respeito e consideração pelas minorias religiosas?

Porque razão se dá a palavra ao PAN, Partido Os Verdes, Bloco de Esquerda e PCP na sessão solene – visto que são minorias políticas – e não apenas aos dois maiores partidos? Seria ridículo, não? Então porque se faz coisa semelhante com as minorias religiosas?Onde está a congruência?

E não me venham dizer que é difícil operacionalizar a representação de todos, porque isso seria outra tirada ridícula. Se o estado laico se quiser dar ao respeito e cumprir a Constituição, então convide apenas e só o presidente da Comissão de Liberdade Religiosa em representação de todas as religiões presentes no país.

Não são os deputados da república também eleitos pelos votos dos fiéis das minorias religiosas? Não são eles também seus representantes? Porquê desprezá-los e discriminá-los assim?

E porque razão os presidentes da república sempre pactuaram com a situação? Não são eles presidentes de TODOS os portugueses? Pelos vistos não.

O que parece é que, na cabeça dos políticos e dos titulares dos poderes públicos, Portugal ainda é um “país católico”, tal e qual como no tempo do Estado Novo.

Lamentável.

 

José Brissos-Lino 

 

 

Dos touros de Lascaux ao cavalo de Guernica (inédito de J.T.Parreira)

Dos touros rupestres de Lascaux, com a sua semiologia, ao cavalo germinal e ao touro tutelar da Guernica, de Picasso, a distância é longa, de facto, e seria de anos-luz se estivéssemos a tratar meios comunicacionais entre galáxias diferentes. A verdade é que essa comunicação apresenta-se com sinais da mesma entidade, o ser humano, que comunica entre si num mesmo lugar que é a Terra.

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Com efeito, estamos diante dos sinais do homem, desde as grutas de Lascaux, onde a riqueza dos signos convoca o estudo dos mesmos pela semiótica, até ao Centro de Arte Reina Sofia, onde a Guernica continua a fazer recuperar uma história trágica da Espanha e dos seus povos, história contemporânea e viva ainda em inúmeras memórias septuagenárias.

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Os contemporâneos de Lascaux, como quaisquer outros habitantes de cavernas do Paleolítico, conheciam o que hoje modernamente se pretende ignorar: a distinção dos géneros, do masculino e do feminino, eles não trocavam nem promiscuíam a beleza da humanidade composta de mulher e homem. O seu conceito de família era rigoroso, os meios usados para a procriação estavam bem definidos e bem representados, com a precisão simbólica que a capacidade artística para o desenho na pedra permitia. O símbolo fálico do homem e os símbolos ovais para representar a mulher não se misturavam nas paredes das cavernas. Seria uma arte da animalidade, como se lhe chamou, mas a sua leitura semiológica – a interpretação dos sinais – nesses desenhos eram o símbolo do homem e da mulher, do pai e da mãe, eram a representação do núcleo fundamental que é a família.

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Os impedimentos para a depravação entre homens e mulheres estavam até graficamente delimitados, a viagem intergaláctica de Sodoma para Roma, através de muitos séculos de maus costumes, não está documentada graficamente como um historial de sentimentos reprováveis e sórdidos. O que a chamada arte parietal, as gravuras nas paredes das cavernas, distinguia, o macho e a fêmea nos seus devidos lugares, milénios depois viria a ser normativo na Bíblia Sagrada. Designadamente nas Cartas de Paulo – a Epístola aos Romanos – onde as paixões infames, a mudança do modo natural das relações íntimas, as inflamações da sensualidade orientadas para o mesmo sexo, são identificadas pelo apóstolo já numa cultura a meio-caminho entre o clássico e a modernidade, comparativamente à época pré-histórica.

Com efeito, Paulo impreca os não-crentes, os ímpios, que supondo serem sábios, com cultura, enveredaram por descaminhos de perversão, sobretudo sexual, contra a própria natureza da intimidade humana, na relação homem-mulher. Sob a luz que ilumina o modo como o homem se perverteu e desviou da correcta adoração a Deus, submetem-se também os desvios dos instintos correctos com os quais o ser humano foi dotado. Alguém escreveu, em comentário de uma Bíblia de Estudo, que “o efeito da perversão da adoração instintiva a Deus é a perversão de outros instintos, que se afastam de suas funções apropriadas. As Escrituras encaram todos os actos homossexuais sob essa luz. A consequência é a degradação do corpo.”

A desintegração daquilo que é verdadeiramente “natural”, parecendo ser um produto da cultura e das sociedades urbanas, altamente desinibidas na contemporaneidade, é, portanto, fruto do desvio do homem em relação a Deus.

© João Tomaz Parreira

O reino (afinal) sempre parece que é deste mundo

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Fico atónito com o expediente de muitos direitistas que tentam a todo o custo relativizar os perigos da personagem política Donald Trump e as consequências destes primeiros e tempestuosos dias de governação na Casa Branca.

Primeiro começaram por defendê-lo da forma mais patética, isto é, dizendo que a maior parte dos disparates saídos daquela boca para fora eram mera estratégia eleitoral.

Depois veio o discurso de posse, ao que consta escrito pelo tenebroso senhor Bannon, que quebrou com a regra de sempre, de respeitar os anteriores presidentes da nação, e que não passou de um conjunto de slogans eleitorais, como se ainda estivesse em campanha.

O discurso da direita passou a defender então que não se poderia criticar um presidente eleito democraticamente em eleições livres. Era o que mais faltava. Um político eleito nas urnas não equivale necessariamente a um governante democrático. Exemplos? Duterte, nas Filipinas ou Mugabe, no Zimbabwe, penso que serão suficientes.

Finalmente chegou-se à governação, transformada em reality show, com um acto litúrgico encenado para cada lei assinada, com declarações desencontradas entre ele e os membros da sua administração, com a defesa despudorada da tortura, com as ameaças aos funcionários públicos que dele discordam (e o expressaram ao abrigo da lei americana), com as ameaças à China, as interferências na União Europeia, os ataques ao poder judicial e muito, muito mais.

Em particular fico pasmado com o apoio acéfalo de tantos líderes religiosos americanos, que estão a dar tiros nos pés todos os dias com esta atitude, vendendo-se por um prato de lentilhas. Vão torcer a orelha no futuro.

Um dos últimos disparates foi, há poucos dias, a intenção expressa pelo próprio Trump de alterar uma lei antiga (e republicana) que impede as igrejas e os líderes religiosos de apoiar candidatos em eleições. Vai ser lindo, vai. Em particular, o evangelicalismo americano  pode implodir com esta irresponsabilidade.

Não que me incomode, apenas me incomoda que o nome de Jesus Cristo – com cuja figura Donald Trump não tem o mínimo de identificação, como se vê – ande prestes a ser arrastado pela lama, devido à vaidade de uns e à sede de poder de outros.

JB-L

Sei lá!

Segundo Umberto Eco, as redes sociais dão voz a legiões de idiotas

Ando a chegar à conclusão nua e crua de que o Facebook não é um espaço especialmente destinado a pessoas minimamente inteligentes. Eu explico. A única maneira de uma pessoa inteligente subsistir por lá é ser muda. Isto é, ser capaz de resistir à tentação de responder à cretinice de alguns (infelizmente muitos!) posts publicados na rede. Falo de futebol de política, de sociedade, de religião, de tudo. É demais.

Uma boa maneira de compreendermos como é que os americanos elegeram um chimpanzé para a Sala Oval é ler o que uns quantos escrevem nas redes sociais (e já agora, as caixas de comentários nos jornais generalistas). A estupidez é tanta que dói.
Mas o Face é terreno fértil para os idiotas, que não sabem trocar argumentos racionais, sustentar uma discussão no bom sentido da palavra (daquele tipo de discussão de onde sai a luz), que não são capazes de defender os seus pontos de vista sem atacar o outro, que adoram puxar de chavões sem pensar dois segundos no que escrevem, e que proclamam pontos de vista radicais sem os saberem defender numa base séria, apenas porque sim…
É claro que sei dar o desconto aos brincalhões, aos provocadores e aos que usam esta rede social só para se rirem um bocado. Isso é saudável, mas não é desses que falo, é dos que se levam a sério. Esses que, se mandassem, seriam uma espécie de hitlerzinhos de pacotilha.
Segundo Humberto Eco, “as redes sociais dão voz a legiões de idiotas”. Ele cita um estudo que mostra que as pessoas inteligentes se tornam mais inteligentes e as pessoas de baixa inteligência se tornam mais tontas na rede.
Depois deste longo desabafo (será do estado do tempo?) dirão alguns: então porque não te vais embora do Face para fora? Francamente não sei. Talvez porque, no fundo, precise de tomar o pulso às pessoas de carne e osso, mesmo aos idiotas, que são como os pobres: sempre os teremos connosco…
Porque não bazar? Sei lá… Estou a tentar descobrir o segredo.

Já agora…

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E depois dos presentes, das refeições e dos cânticos de Natal, o que fica? Voltaremos à vidinha do costume, aquela pasmaceira letárgica a que chamamos existência, ou vamos fazer alguma coisa para dar significado aos dias? Sei lá? Fazer algum tipo de voluntariado útil, estudar coisas que interessem, arriscar, dar, criar.

E já agora, tentar conhecer um bocadinho o tal Menino cujo nascimento acabámos de celebrar com tanto entusiasmo, presentes, refeições e cânticos. Já agora…

 

3 idiotices de pais de crianças americanas

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Uma pessoa vê com cada uma… Acabei de ver num canal de televisão português uma peça duma estação americana, supostamente divertida, em que os pais dizem às crianças, na manhã seguinte à noite do Halloween, que lhes comeram os doces todos e não restou nada. Claro quer todas as crianças ficaram em estado de choque, desesperadas, revoltadas e a chorar.

Primeira idiotice: fazer tal coisa aos filhos.

Segunda idiotice: filmar as reacções das crianças.

Terceira idiotice (e porventura a mais grave): divulgar tais vídeos na internet.

A minha conclusão: com pais destes não admira que o Trump tenha tanto apoio eleitoral. Cambada de idiotas…

Cinco elefantes e um camelo

 

A famosa hipérbole utilizada por Jesus Cristo sobre o camelo passar pelo buraco duma agulha pode ter sido influenciada por um provérbio grego, bem mais antigo, e que terá sido transmitido por Adamâncio no Physiognomonicon:

“Mais facilmente se esconderiam cinco elefantes sob uma axila do que alguém de costumes infames (pathicus)”.

Este tipo de figuras de estilo enquadrava-se perfeitamente no discurso do Mestre, e ele utilizou-as abundantemente, pois permitia-lhe ser entendido por gente culta e indouta, judeus ou gentios, de todas as idades, género, culturas e etnias.

“Porque é mais fácil entrar um camelo pelo fundo de uma agulha do que entrar um rico no reino de Deus.” (Lucas 18:25)

A importância do episódio revela-se pela atenção que lhe dedicam tanto Lucas como os outros evangelistas autores dos sinópticos: Mateus (19:24) e Marcos (10:25).

Qualquer análise à frase em si mesma resulta numa impossibilidade. Assim como não se podem esconder “cinco elefantes sob uma axila”, também será impossível “entrar um rico no reino de Deus”. Ou “no reino dos céus” (Mateus 19:23).

Ao longo dos séculos tentou-se “amaciar” o sentido do texto. Para isso recorreu-se à interpretação do termo “camelo”. Que seria a Porta do Camelo, uma porta muito baixa em Jerusalém, que obrigava as pessoas a curvarem-se para a passar, significando que um rico poderia entrar no reino de Deus desde que se humilhasse.

Outros afirmaram que o tal “camelo” seria o cabo de sisal de amarração dos barcos, o qual, sendo pacientemente desfiado, passaria fio a fio pelo buraco da agulha. Ou seja, seria muito difícil que um rico acedesse ao reino mas não impossível.

O termo grego kámelos (κάμηλος) significa exactamente o nosso camelo-animal, do latim camelus. Em Marcos 10:25 e em Lucas 18:25 a palavra usada é kámelon (κάμηλον), referindo-se claramente ao animal. Vem do termo hebraico gamal (למג), usado para identificar aquele mamífero ungulado nosso conhecido (Camelus Bactrianus). E o termo grego para agulha éraphís (ραφίς), aquele objecto utilizado na costura, com a especificidade de Lucas usar o termo belónes (βελόνης), que significa agulha cirúrgica.

Portanto, nenhuma destas interpretações satisfaz, nem vem na linha da impossibilidade prática para que aponta a hipérbole. De facto nem se podem esconder elefantes numa axila, nem um rico pode entrar no reino de Deus. Não, não se trata de discriminação, nem de inveja social. Um rico não pode entrar no reino tal como um pobre também não pode, nem um remediado.

Porquê? Então quem entra?

É simples. Ao sermos acolhidos no reino de Deus deixamos pelo caminho todos os factores de distinção social. Deixamos de ser ricos ou pobres, feios ou bonitos, gordos ou magros, pretos ou brancos, cultos ou indoutos, homens ou mulheres, crianças ou velhos. Somos apenas seres humanos totalmente iguais em dignidade perante Deus e o próximo, pois Ele não discrimina pessoas: “Porque, para com Deus, não há acepção de pessoas.” (Romanos 2:11).

As barreiras entre seres humanos são construídas por nós e não podem subsistir no reino de Deus, que se pauta por outros valores e filosofia. Jesus de Nazaré nasceu numa manjedoura, sendo adorado pelos anjos, por pobres pastores e por abastados sábios vindos do Oriente. Todos convergiram sobre aquela estrebaria precária.

O Eterno fez-se “rei dos judeus” e, sendo homem, abriu a porta para que todos os homens pudessem entrar no seu reino, sem ter que pagar qualquer espécie de portagem.

José Brissos-Lino

O túnel

Uma parábola que ilustra muito bem a que chegou a nossa sociedade pós-moderna e relativista. 

Um comboio entra dentro de um túnel. Os passageiros dão-se conta disso: parece ser um túnel como tantos outros pelos quais passaram anteriormente, um túnel que, como é sabido, tem princípio e fim. Mas a travessia do túnel dura e dura, a velocidade aumenta. As pessoas começam a inquietar-se. Por fim, um dos passageiros faz das tripas coração e dirige-se à cabine do condutor da locomotiva. Está vazia! E o comboio precipita-se mais e mais para o abismo.

Fonte: Der Tunnel, Friedrich Dürrenmatt, enviado por Vitor Rafael.